quinta-feira, 9 de abril de 2020

Para Lev

Quem sabe como é a dor de quem não pode ver e não pode tocar no seu amor? Quem sabe a amplidão do espaço entre dois braços vazios? Ou a inutilidade de uma boca que não pode beijar, de um nariz que respira mas não aspira o cheiro da pessoa amada? Quem sabe da dor que preenche o peito, sobe pela aorta entumescida e escorre abundante pelos olhos para não te matar? Cada molécula minha grita por uma pessoinha, cofrinho pequenino que carrega distraído o meu coração. Ele nem sabe o quanto sofro. Pensa que estou longe e viva mas não entende que quero mais que tudo, mas não posso estar com ele. Lev, meu príncipe, eu sofreria menos se você tivesse idade para entender que eu o amo demais, mas existem coisas ruins que separam vovó de você. Como fazer para que você não fique triste e entenda o que me segura aqui? Será que terei ainda a chance de me sentar com você e explicar tudo isso? Só quero que você me olhe nos olhos e diga com essa doce vozinha rouca:"sim vovó, eu sei". Com minha dor eu lido, mas a sua torna a minha insuportável.

domingo, 5 de abril de 2020

Três de Mim



Três de meu sangue vieram: Valentína, Lev e Rod. Vivi, a primeira, foi quem me abriu as portas do paraíso. Antes dela a vida parecia estática, sem grandes alegrias, sem futuro brilhante, sem amor desmedido. Quando achava que não poderia haver nada melhor no mundo e nem igual, minha filha deu-me Lev, meu amado príncipe, aquele que provou a força da atração pura dos sexos. Enlouqueci de amor por aquele homenzinho e agradeço por não tê-lo sempre ao meu lado, pois é certo que eu o estragaria com tantos mimos. Aí veio a cereja do bolo, o lindo Rod, uma pequena cópia da mãe, mas com cabelos loiros e olhos verdes. Agora sei que não preciso de mais nada, só que eles cresçam felizes e saudáveis ao lado dos pais maravilhosos, excelentes jardineiros das lindas e exóticas flores que a vida me deu. Sou muito grata.

Memórias de Infância - Biscoito de Queijo

Eu era muito pequena nessa época. Sei que tínhamos um lindo pé de jenipapo selvagem no jardim, que cobria-se de flores perfumadas para nutrir inúmeras abelhas e depois enchia-se de frutos para a delícia dos passarinhos. Aquilo me encantava. Lembro-me que minha mãe de vez em quando recebia amigas da igreja para o que eu chamava de "reginião"(reunião, na linguagem dos adultos). Lembro-me que à noite eu sempre me ajoelhava na beira da cama e pedia ao papai do céu que fizesse o pé de jenipapo dar frutas para os passarinhos e que as galinhas botassem muitos ovos para ter biscoitos na "reginião". O primeiro motivo era altruísta, mas o segundo não. Sempre tinha uns biscoitos de queijo que eram meu sonho de consumo, mas geralmente não sobravam para mim, porque eu só podia comer depois que as senhoras se retiravam e geralmente não sobravam para mim. Um dia resolvi fazer justiça com minhas próprias mãos, porque achei que depois de tantas orações eu merecia comer pelo menos um fruto da misericórdia divina. Abri o armário e peguei um. A partir de então entrei num frenesi e fui comendo, certa que minha mãe não perceberia. Quando sobraram três fiz uma distribuição no fundo do prato que achei muito convincente e fechei o armário. Vocês podem adivinhar o que aconteceu quando minha mãe descobriu: uma surra de criar bicho. Enquanto apanhava eu só pensava que minha mãe devia ter poderes sobrenaturais para descobrir que eu tinha comido alguns biscoitos. Rs