terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Lembranças

Na fazenda de meus avós, chamada Centro, as rodas d'água eram responsáveis por grande parte da economia. Uma movimentava o monjolo, onde tirava-se a casca do arroz e socava-se o milho para fazer fubá e canjiquinha. Outra girava a moenda de cana para fazer a garapa e dela o açúcar e a rapadura. Fervia em enormes tachos de cobre e exalava um cheiro delicioso. Parte dela era usada para fazer a cachaça Centralina e muitas vezes trabalhadores eram encontrados ao lado dos alambiques totalmente bêbados de tanto experimentar. Eram expulsos imediatamente por minha avó Isabel, empregadora justa mas exigente. E tinha ainda a roda maior da madeireira, que acionava os enormes serrotes, mas seus dentes vorazes me amedrontavam e eu não me aproximava muito. Gostava mesmo era de "ajudar" um senhor de pele cor de carvão, descendente dos escravos da família que continuaram na fazenda depois da Lei Áurea e a quem eu chamava de compadre. Hoje percebo que minha cooperação não era tão valiosa quanto eu achava, pois enquanto ele carregava feixes de cana eu conseguia levar apenas o pedaço de uma. Mas conversávamos muito em nossa jornada de trabalho e ele contava-me histórias maravilhosas.

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